Como um livro mudou a minha vida

Hoje, 28 de Abril, é o Dia da Educação. Aproveito para compartilhar com os leitores do blog uma pequena história que tem tudo à ver com o assunto. Vou contar, em poucas palavras, como o pequeno gesto de uma professora pode ter mudado a minha vida. Num país em que se lê cada vez menos e onde a literatura parece mergulhada numa mesmice, descobri o prazer de ler, escrever e aprender. Mais que isso, acredito que sem o gesto dessa docente, que me apresentou o mundo dos livros, talvez eu tivesse me perdido para as drogas, o crime e tantos outros perigos que me rodeavam.

Como um livro mudou a minha vida
Sou nascido e criado numa família pobre. Livros nunca foram prioridade na minha casa. Meu avô não acreditava na educação e não comprava cadernos, nem livros. Minha mãe, por exemplo, tinha um único caderno para ser usado no ano inteiro. Ao final do ano letivo ela precisava apagar tudo o que tinha escrito naquele caderno se quisesse usá-lo no ano seguinte. Não é preciso nem dizer que esse não é o melhor incentivo que uma criança pode receber. Tanto é que ela parou de estudar logo cedo. E, assim como ela, seus irmãos mal passaram da quarta ou quinta série.

Eu tinha tudo para seguir o mesmo caminho. Mas, felizmente, não foi o que aconteceu. Tive a sorte de ter cruzado com bons professores em minha jornada, mesmo sempre tendo estudado em escolas públicas e apesar de ter me criado num conjunto habitacional. Com o tempo adquiri o gosto pela leitura e pelo aprendizado. Mesmo vivendo num lugar sem muitas opções de lazer, e cercado pelas drogas, consegui me afastar das más companhias e deixei ser guiado pelas belas histórias de grandes mestre da literatura.

Um dos meus livros prediletos de ficção até hoje, e o primeiro que li, é "Doutor Miragem" do escritor gaúcho Moacyr Scliar. Posso dizer que esse foi o livro que abriu as portas da minha percepção (aproveitando para parafrasear Aldous Huxley). A obra foi apresentada por minha professora de Língua Portuguesa e Língua Inglesa quando eu estudava na quinta série, Lenita, se não me engano.

Depois de ler aquele livro, mergulhei num admirável mundo novo. Um mundo de fantasias que contrastava com o ambiente inóspito de um bairro pobre de periferia. Quando terminei de ler, logo quis conhecer outras obras desse autor. Em pouco tempo li praticamente todos os livros da pequena biblioteca da escola.

Sem dinheiro para comprar livros, encontrei na Biblioteca Pública Municipal a fonte para saciar minha fome por livros. Li de Hemingway a Machado de Assis, de Prost a Mario Quintana, Isamov a John Fante. Mergulhei na ficção e na não ficção. Praticamente passava minhas tardes lendo na biblioteca. Minha voracidade era tanto que eu era capaz de ler um livro por dia dependendo do número de páginas e da qualidade da prosa.

A Biblioteca da cidade já não me bastava: o acervo deixava à desejar para um ávido leitor e não haviam lançamentos. Mais tarde, trabalhando como empacotador em meio turno num supermercado, passei a estudar à noite. Sem muito dinheiro para comprar livros novos, encontrei num sebo a solução para saciar minha sede de leitura. Embora os livros não fosse novos, o importante é que eu podia encontrar verdadeiros tesouros que não existiam na biblioteca.

(Nesse ponto descobri algo interessante, e triste: muitas das obras literárias à venda no sebo tinham o carimbo da biblioteca municipal da cidade, e até de algumas escolas.)

Com o tempo acabei acumulando uma boa biblioteca, com dezenas, centenas de livros usados. Mais tarde, passando por uma época de vacas magras, veio uma época realmente triste. Tive de me desfazer de muitos livros, vendendo-os de volta ao sebo por um terço do valor que havia pago. Para continuar lendo coisas novas achei outra solução: a troca de livros. O problema é que a troca acontecia no esquema dois por um. Resultado: com o tempo minha biblioteca evaporou.

À princípio pode parecer triste. E é. Mas pense assim: os livros se foram. As palavras neles escritas seguiram seu caminho. No entanto, todo o conhecimento que adquiri com a leitura permanecem comigo. Os livros que um dia li serão meus eternos amigos. E os seus autores tem lugar cativo na minha memória e na minha história de vida.

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